quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Jornal Ícone - TENSÃO OU TENÇÃO? Presta AtenÇão !


Paulo Brites (*)

“A luz, por mais fraca que seja,

vale mais que todas as trevas juntas.”

                  Leonardo Boff



Recentemente, um amigo que monta computadores para vender, me pediu para reparar duas fontes que, segundo ele, nunca haviam funcionado.

Argumentei que neste caso ele deveria recorrer ao vendedor e solicitar a troca das mesmas, mas ele já não tinha mais a nota fiscal e nem lembrava onde as havia comprado.

Então mãos a obra, amigo é pra essas coisas.
As fontes vinham embaladas naquelas caixas de papelão padronizadas que se encontram para vender no comércio. Isso já indicava não se tratar de uma empresa de grande porte.




Examinando com cuidado percebi que a logomarca ISO  (*) estampada na caixa era uma montagem.  Até aí “tudo bem”, pois até os guarda chuvas chineses que os camelôs vendem nos dias de chuva teem etiqueta com ISSO 9002!.

Se isso não bastasse, vejam no destaque que a caixa foi raspada e colocado por cima uma etiqueta onde está escrito OEM (Original Equipment Manufacter) e o modelo 500 MVC-1
.
Vamos descobrir quem é o fabricante?

Bem, essa é uma tarefa que nem Sherlock Holmes conseguiria, pois em nenhum lugar da caixa aparece o nome do fabricante ou o CNPJ do mesmo.

Pera aí, quem sabe está na etiqueta com as especificações que costuma vir colada no gabinete da própria fonte e eu, com minha língua ferina, estou falando de mais e já-já irei queimá-la.

Então vamos lá, aí está a etiqueta.                                                                                                                       

Sensacional: - Indústria Brasileira!  Qual?  Cadê o CNPJ? Notem que há etiqueta com o modelo, SN (que deve ser Seral Number), Indústria Brasileira e data de fabricação colada próximo ao local onde outras informações foram raspadas.

A falsificação é tão grosseira que o idiota que a fez não teve nem o cuidado de colocar a sua etiqueta por cima da outra.

Resolva inspecionar mais a etiqueta à cata de alguma informação.

Achei!

Já sei porque a fonte nunca funcionou. Dá só uma olhadinha logo abaixo da palavra PERIGO e você também irá descobrir: - Esta fonte de alimentação utiliza alta TenÇão. Ai! Tensão com cedilha, cruz credo! Assim não funciona mesmo.

Minha má vontade com o sujeito que vendeu estas porcarias está aumentando cada vez mais, mas vou tentar manter a calma como sabiamente recomendou Kipling  em seu poema: - “Se és capaz de manter a tua calma quando todo mundo ao teu redor já a perdeu ....”

Feitas estas analises preliminares eu já sabia que iria me deparar com duas bombas para tentar reparar e, de duas uma: ou seria um molezinha ou algo que jamais seria reparado. Por enquanto estou propenso a apostar na opção B, mas tentarei “subornar” meu preconceito.

Digo isto baseado num fato que todos nós que militamos na área de reparação sabemos, quando um equipamento novo não funciona é provável que algum componente não esteja perfeitamente soldado na placa ou algum conector esteja mal encaixado. Enfim alguma coisa que uma boa e acurada inspeção visual irá detectar.

Se assim não for então a coisa se complica, pois pede ir desde um componente faltando ou colocado no local errado até um projeto mal feito.

Parti para abrir as duas caixas de encrenca. Os defeitos eram diferentes (e depois eu descobri porque).  Uma delas só funcionava se fosse ligada em 220 V com a chave comutada para esta tensão obviamente, porém com a linha de + 5 V fornecendo 5,8 V e a de 12 V fornecendo 7,5 V, ou seja, o famoso compre um e leve dois (defeitos).

A segunda estava completamente morta e ao abri-la percebi de cara que alguém já havia “passeado” por ali graças as diversas marcas de resoldagem que se podia ver.

Com certeza não teria sido o meu amigo, pois ele nem sabe usar um ferro de solda.  Ele é montador de computador e só sabe encaixar plaquinhas, conectores e formatar HD.

Ao comparar as duas vi que embora os modelos declarados nas embalagens fossem iguais elas não eram “irmãs gêmeas” o que poderia ajudar, em parte, a explicar porque os defeitos eram completamente diferentes.

Mas a minha dose de irritação não havia chegado ao clímax e só quando comecei a manipular as placas ainda na tentativa de encontrar algo simples de ser resolvido é que minha ira veio completamente à tona (Kipling que me desculpe, mas não dá mais para manter acalma).

Pois bem vejam a foto abaixo e digam se eu tenho ou não razão para nomear o “fabricante” destas fontes de mau caráter, na melhor das hipóteses.
         
Reparem no detalhe o que o bandido (o outro nome não fica bem escrever aqui) fez. Ele juntou diversos fios da linha de alimentação num único fio do mesmo diâmetro e ligou na placa da fonte.

A Lei dos Nós é um principio básico da eletricidade (que ele certamente: não sabe) : - a soma das correntes que saem é igual a soma das correntes que chegam.
  
Para fazer este tipo de ligação ele deveria, pelo menos, ter usado um fio de bitola maior na saída.

   Pior ainda fica a situação dos fios pretos que correspondem aos diversos negativos e por onde circulará toda a corrente fornecida pela fonte.       

Antes que alguém queira contra argumentar que no final todos os fios vão parar na placa, é bom dar uma olhadinha e ver o tamanho da  área onde estes fios são soldados em qualquer fonte minimamente decente.

Voltemos à embalagem e veremos que lá está escrito “conformidade com os regulamentos das normas de segurança”.  Pelo que vimos acima só dá para dizer que tem que ter muita cara de pau para escrever isso.

Depois disso tudo desisti de tentar reparar estas fontes e comuniquei ao meu amigo que não iria fazê-lo, pois não queria ser conivente com aquela ligação criminosa caso as fontes viessem a pegar fonte  dentro do gabinete dos clientes e recomendei-lhe que o melhor que ele deveria fazer era jogar aquelas porcarias no lixo, mas não sem antes passar com um trator por cima delas.

Resolvi transformar este assunto em matéria para o Ícone para servir de alerta e enfatizar que devemos ter o máximo de cuidado ao adquirir um produto, principalmente quando a marca do mesmo não é conhecida ou nem existe, como neste caso.

Se estas fontes tivessem marca e fosse possível encontrar o fabricante, principalmente através do CNPJ, poderíamos até responsabilizá-lo, mas reclamar com quem de um produto como este?

Esta claro que neste caso não se trata de uma empresa séria e sim de um picareta totalmente irregular e que se esconde de todas as maneiras vendendo porcarias como estas e ganhando dinheiro fácil dos incautos de forma desonesta e sonegando impostos.



Fiquem atentos e orientem seus clientes para prestarem atenção (aqui é com cedilha) no que compram e onde compram e pedirem a nota fiscal para não comerem urubu como se fosse frango a passarinho.

Em todo produto tem que constar o CNPJ da empresa quer seja a fabricante ou a importadora.  Se não tem CNPJ não comprem porque é pirataria ou produto sem nenhuma qualidade ou confiabilidade.

O recado está aí, agora é com vocês.

Abraços e até sempre.

* Técnico em Eletrônica da Fundação CECIERJ/CEDERJ
      Professor de Eletrônica Aplicada ao Áudio do IATEC
      Professor de Física do Colégio Estadual Joaquim Abílio Borges

Um comentário:

  1. Olá Paulo,

    há alguns - muitos anos - acompanho os seus textos, tanto na net como na revista Antenna.

    Estas fontes que você recebeu para reparo são na verdade fontes que foram descartadas e vendidas como sucata. Ocorre que há um 'fabricante' que compra estas fontes, as conserta, põe numa caixa nova e as vende como novas.

    Inclusive, há algum tempo houve um escandalo envolvendo um pseudo-fabricante nacional que estava revendendo estas mesmas fontes. Vide os links:

    http://www.clubedohardware.com.br/artigos/1844

    http://www.clubedohardware.com.br/blog/328

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